sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Em uma estrebaria

Phillip Keller, em seu livro Cordeiro de Deus, conta que em uma viagem pelo Paquistão, foi surpreendido por uma tempestade fortíssima e convidado a abrigar-se em uma casa muito pobre, na qual teve de entrar agachado, tão diminuta era a porta.

Viu-se em um cômodo sem janelas, com uma trempe ao centro com a panela em que se cozinhava a refeição aquecida por um fogo fumacento em que a lenha era esterco de animais. Depois de alguns minutos, após se acostumar ao fedor acre e ao ardor da fumaça nos olhos, percebeu do outro lado do cômodo, uma jovem magra com um bebê no colo. Rapidamente percebeu: foi num ambiente como esse que o Senhor Jesus nasceu.

Quando eu li este relato gastei algum tempo para digerir as imagens. Porém logo tive de discordar. É um quadro chocante para nós ocidentais, que cozinhamos com muito asseio, mas eu me lembro de minha infância em que, por diversas vezes, em um campo missionário novo, para o qual meu pai fora designado, que minha mãe precisou armar uma trempe – fora da casa – e eu a ajudei a acender o fogo. Só não usamos esterco, pois era fácil achar gravetos. O esterco era queimado à noite, em pequenas quantidades, para espantar, muriçocas ou carapanãs.

Porém, meu maior ponto de discórdia não foi a descrição do ambiente miserável. Ele descreveu um ambiente de habitação humana. Ambiente miserável sim, mas uma casa. Ao passo que não houve casa para o Senhor nascer. O texto sagrado diz que ele nasceu, foi enfaixado e deitado em uma manjedoura. A rigor, manjedoura pode ser apenas um coxo ou uma gamela, porém a leitura do texto de Lucas, nos leva a entender que o parto se deu em um local onde estava essa gamela. Portanto é de se supor que tenha acontecido em uma estrebaria: um ambiente de habitação animal. Lá o esterco não era usado com fins “nobres”, era simplesmente o dejeto dos animais. Esse foi o lugar que sobrou para que o Rei dos Reis, Senhor dos Senhores, Deus todo-poderoso, nascesse.

Não podia ser diferente. Ao encarnar-se ele tomou a natureza da criatura pecadora e pecaminosa, revoltada e rebelde contra ele. Criatura, cujos melhores atos, diante dele, são equivalente a trapos sujos de menstruação. Criatura, cuja situação não podia ser resolvida apenas com a frase “Está perdoada. Vai em paz.” Para que essa frase pudesse ser dita, era necessário um sacrifício muito maior. Infinitamente maior. Tão assustadoramente maior, que, apenas aquele que conhecia a extensão da ofensa, poderia dimensionar sua cura e prescrever seu remédio. E seu remédio começou no ato de assumir a natureza do homem rebelde, não contaminado pela rebeldia, mas sujeito a todas as desgraças que a rebeldia lhe impôs: Nascer desprezado por aqueles que ia salvar: Nascer no meio dos dejetos não apenas dos homens, mas também dos animais: Nascer em imundícia tal que já prefigurava a morte que lhe estava reservada.

Além da ilusão boba que os presépios modernos nos trazem, como colocar os magos na primeira noite, costumam também se parecer celeiros americano, desses que se vê em filmes, do que uma estrebaria oriental, com sua imundície característica e nos distrai da tragédia que aconteceu a nosso Senhor.

Sempre perguntei por que razão a providência divina determinou que ele nascesse assim. Creio que uma boa resposta é essa: Deus o humilhou. Na teologia diz-se que este foi o primeiro estágio de sua humilhação: nascer como servo. Entretanto isso ainda não explica a estrebaria.

A melhor explicação que eu encontro ainda é alegórica. É como se o Senhor estivesse dizendo: Mesmo que seu coração seja imundo como uma estrebaria, cheio dos dejetos mais nojentos, eu farei dele a minha casa.

Imagine como era a estrebaria quando ele nasceu lá e compare com o que era seu coração quando você se tornou sua morada. Havia diferença? Aliás, há diferença? Você mantem seu coração livre dos dejetos do pecado, ou continua obrigando o Senhor a conviver com eles?

Aleluia! Glória a Deus nas maiores alturas e paz na terra à quem ele quer bem!

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