sábado, 22 de junho de 2013

Protestar? Contra o que?

Temos visto nos últimos dias uma série de protestos em diversas cidades brasileiras. Parece que tudo começou com a insatisfação pelo aumento do preço das passagens de ônibus. Porém ...

Primeiro: Como explicar protestos em cidades onde não houve aumento do preço das passagens? Precaução para que não haja? E como explicar a continuação dos protestos nas que já cancelaram os reajustes?

Segundo: Como explicar as múltiplas reinvindicações? Se o começo foi um protesto contra o aumento das passagens, por que houve manifestações também contra os gastos com a Copa das Confederações, ou contra o PEC 37, ou pela melhoria dos hospitais e das escolas públicas, ou contra a ação policial, ou pela “volta dos bondes de Sta. Teresa”, pelo direito de aborto, contra a corrupção, contra a opressão e outras.

Terceiro: Como é possível se ver a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro ser depredada e incendiada, o Congresso invadido, a Prefeitura de São Paulo e o Itamarati ter seus vidros quebrados e concordar com repórteres, comentaristas e autoridades que estamos vendo uma conquista da democracia? Que democracia é esta que picha um “A” de anarquia sobre a bandeira nacional?

A imprensa internacional, que nos vê com uma distância crítica, também não entende: A BBC vê uma insatisfação com as despesas com a Copa das Confederações diante de tantas outras necessidades. O Le Figaro é mais explícito e diz que “A onipotência da Fifa mexe com a raiva dos brasileiros”. O The New York Times compara com a Revolta do Vintém de 1879 (que ao ser estabelecida a cobrança de passagens nos bondes, a população do Rio de Janeiro, chegou a arrancar os trilhos das ruas, levando D. Pedro II a destituir o ministro que estabeleceu a cobrança).

Porém, tenho a impressão de que elas refletem algo maior e mais difuso: uma desilusão mundial com os governantes sempre mostrados pela imprensa como ineptos ou corruptos. É como se nosso país passasse a fazer parte das manifestações mundiais.

As primeiras atingiram os países árabes (a chamada primavera árabe, que só recrudesceu os governos islâmicos contra os cristãos que habitam nesses países), depois vieram as manifestações americanas, gregas, portuguesas, espanholas, suecas e mais recentemente a turca.

Veja que todas estas manifestações possuem uma espécie de gatilho que as desencadeia e logo elas se tornam difusas deixando de lado a reivindicação que as desencadeou. As da primavera árabe começaram com o suicídio do jovem tunisiano Mohamed Bouazizi, que ateou fogo às próprias roupas desesperado com as extorsões que sofria das próprias autoridades. O movimento se alastrou pelo Egito, Líbia, Síria (onde tornou-se a guerra sangrenta que estamos vendo) e com menor força (ou melhor reprimida), no Kuwait, Marrocos, Arábia Saudita e outros.

Na América do Norte, foi algo mais concentrado na especulação financeira de Wall Street e acabou sendo sufocada pelo desgaste natural ou pela melhora, ainda que pífia, da economia.

Nos países europeus há uma diferença enorme entre os países que com crises econômicas (Grécia, Portugal e Espanha) e a Suécia, onde a revolta é produzida pelos imigrantes mais bem acolhidos de toda Europa, provocando o espanto em toda população sueca.

A turca é um pouco diferente. O gatilho foi a demolição de uma praça, e, se num primeiro momento, houve uma dispersão de protestos, depois eles se concentraram na queda do Primeiro Ministro Erdogan.

A aparência desses movimentos, ainda que o conteúdo deles seja diferente, não se assemelha com os que vemos aqui? Parece que é nossa vez (A Agência Reuters já chama de Primavera Tropical). Meu receio é de que o governo não a controle, pois já houve protestos em mais de 100 cidades e algumas já atingiram 1 milhão de manifestantes. E como nosso governo se vale muito do futebol para desviar a atenção dos problemas nacionais desta vez não conseguirá pois muitos estão protestando exatamente contra as imposições da FIFA. Aliás já escrevi algo sobre isso em 17/12/11.

Os especialistas em comportamento de massa dizem que é esperado estatisticamente (conforme a curva de Gauss?) que um pequeno grupo participe apenas olhando e outro pequeno grupo parta para a agressão enfurecida, enquanto a grande maioria faz apenas o que se propôs. Isso talvez explique a presença de vândalos em todas as manifestações, pois seria demais que a organização do evento contrate um grupo para tanto.

As Redes Sociais são outro aspecto do qual não podemos nos esquecer. Elas tornaram possível a criação de um sentimento de frustração e até de indignação e facilmente o transforma em atos concretos.

No começo dessa semana recebi um pedido para participar de um abaixo-assinado virtual, contra o uso de balas de borracha, feito por um repórter que pode perder a visão. Enquanto eu examinava o site do abaixo assinado, vi um link para uma ferramenta que organiza facilmente um protesto. Nela alguém tinha acabado de escrever ao proprietário reclamando que havia pedido um “espaço” para organizar seu protesto mas já se passara horas e não havia sido atendido. Enquanto eu lia, apareceu a resposta: “pode acessar agora, que está livre pra você”.

Se o tal sentimento chegou, devemos pedir a Deus, que o use para o bem do País e que o mesmo não chegue à violência que vimos na Síria, onde, dias atrás, um combatente, matou um soldado do governo, abriu-lhe o peito, arrancou o coração e o mordeu na frente das câmeras ameaçando fazer o mesmo a todos os soldados do regime.

Como cristãos, podemos protestar? Claro que sim! Podemos fazê-lo com violência? Claro que não!

Não é sem razão que somos chamados de protestantes, mas nunca lançamos mão da violência, do crime ou da desordem nem da mentira para protestar. Temos esse nome como referência à carta de protesto assinada pelos príncipes luteranos contra a reafirmação do Édito de Worms feita pela Dieta de Speyer em 1529.

Oremos pelo nosso país e não participemos do que é mau nem do que certamente levará ao pecado. E nos lembremos sempre da ordem divina: “Não espalharás notícias falsas, nem darás mão ao ímpio, para seres testemunha maldosa. Não seguirás a multidão para fazeres mal; nem deporás, numa demanda, inclinando-te para a maioria, para torcer o direito” (Ex 23.2).

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